São Paulo, Av. São João, 407 (de um hotelzinho improvisado que busquei refúgio agora).
28 de dezembro de 2011: três dias para o fim do ano.
Escuta. Hoje fiquei o dia inteiro deitada numa cama de casal amarrotada rabiscando meu corpo à caneta, pensando em você, apontando nuvens da janela, esperando o telefone tocar. Caiu uma chuva boba aqui há pouquinho, ainda não tive coragem de sair na rua, comprar pão, marcar minha passagem de volta na rodoviária, tomar uma atitude. Tudo às vésperas do ano-novo. Me falta fôlego pra tanta promessa de novidade. Eu sei que todo mundo está esperando uma mudança grande nas apostas de mensagens de luz estampadas em tantas camisetas brancas. Inclusive eu. De uma forma mais ou menos hipócrita, mas eu também. Não importa tanto. Importa é que isso tudo trouxe de volta um frio duvidoso na barriga agora: aquela quase-vontade-de-você. Vim te procurar pra contar que tenho arquitetado um plano particular pra te ter aqui outra vez, embrulhado em laço vermelho gigante, carregando um sorriso charmoso de felicidade que um dia me fez acreditar em tudo-de-novo. Loucura. Eu sei. Mas todo mundo tem direito a um pedido particular e impossível no último dia do ano. "Carpe Diem" e toda-qualquer bobagem que te faça feliz.
Faz tempo que eu não te encontro em nenhuma rota de fuga, nenhum filme na TV, nenhum gosto de hortelã mastigada no canto da boca que me lembra tanto seu contorno e suas manias. Aguardei teus presentes, chamegos, mimos, beijos telepáticos de madrugada por pensamentos de saudade. Nada. Você sumiu na data mais esperançosa do ano, como se não precisasse reafirmar valores e pesar desejos. Eu fui ao cinema, vi todas as luzes lindas na 23 de maio, comprei panetone, fiz uma oração antes de jantar e dormi sozinha antes de discar o seu número no visor do celular. Não tenho me divertido tanto como antes, nem feito grandes jogadas para conquistar as coisas. Espero pouco das pessoas e dou apenas parte do que sou capaz de oferecer.
Tenho me arriscado menos, contrariando a minha personalidade. O resultado disso são doses cavalares de falta de companhia e, agora, tarde no meu entendimento, essa saudade de você. Hoje gozei de solidão duas vezes afundada numa banheira descascada que pinga água de um lado só, abracei meus cotovelos de madrugada embaixo da coberta, vi TV no mudo e me contraí inteira num banho gelado de vinte minutos que serviu apenas para reafirmar minha habilidade em praticar solidão. Ou minha mania escrota de querer romancear as coisas com ironia. Sempre fiz pouco caso do amor e tomei na cara rindo quando ele me pegou de surpresa.
Admito. Não estou feliz, mas não tenho nenhum medo de não conseguir ficar. Não agora, enquanto eu me fortaleço de toda a minha capacidade de reerguer o que sobra de mim em finais sem esperança. Enquanto eu estranho tanto gostar de você e querer isso mesmo sem saber porquê. No último dia do ano eu renasço, mudo, esmurro a ponta da faca se for preciso, como canta o Cazuza no som da cozinha agora. Driblo nossa indiferença pra ser feliz com o teu amor: mesmo longe, mesmo sem sinal vital ou qualquer indicação de que os meus sonhos confusos possam mesmo acontecer.
Sei que sou uma mulher que não soube dar à luz, amarrar um laço, ficar em um lugar só. Você sabe, enfim. Agi o tempo todo, ou boa parte do tempo todo, movida por desejos intempestivos de mudanças bruscas. Uma série de novidades que perderam a graça com a mesma velocidade urgente que eu as quis e conquistei. Não me arrependo, nem me condeno. Te levei pra longe, mas você me fez acreditar que eu poderia ser amada assim: em qualquer nível de mutação. Acreditei (acredito? acho que sim, talvez, meu deus como estou confusa). Não sei se estou bem ou mal, doente ou saudável, feliz ou descontente agora, escornada em um sofazinho de camurça falsificada tentando desabrochar para o que der e vier.
Muita gente me acha alguém de exemplo: bem de pele, de cama, de vontade de viver. Eu sempre respondo que depois de largar o cigarro a gente passa a ter mais ar para respirar e sorrir melhor, nada demais. Blah. Que besteira. Parece que realmente a gente não pode mais dar um trago num cigarro, nem ficar em silêncio, nem querer de volta alguém que já morreu. É crime: condenação popular. Discordo e nem discuto se eu puder ficar quietinha aqui sem ninguém apontando a direção. Acho que tenho direito aos meus quinze minutos de anonimato e falta de tempero para o convívio social à qualquer custo e todas as regrinhas malucas que ele coloca na sua cabeça. Cheguei à conclusão que nem sempre existe o jeito certo ou o errado: existe o momento. Que às vezes se encaixa dos dois lados.
Achei que devia casar contigo. Montar uma família, colecionar pratos, ficar bonita e feliz durante um bom tempo. Tsc. Não sei o que me faz falta: só sei que no meio de tantas buscas e abismos e desencontros vazios, eu tropeço quase sempre em você. No fundo e com uma pontada de saudade, preciso apenas que você mostre que ainda esta aí. Manda um sinal de fumaça, um telegrama, uma interrupção em rede nacional na programação televisiva do país inteiro em minha intenção, ou um alô genérico qualquer. Quero saber se você ainda existe, daquele jeito meu ou de qualquer um. Não importa tanto como você vai aparecer. Eu vou gostar, saiba disso apenas.
Porque certas coisas não mudam. Você nunca foi e nunca será. Você simplesmente é. E quero essa promessa antiga de volta. Me permito acreditar em você quando for erguer um copo de bebida qualquer pra brindar tanto faz o que for. Você é minha esperança em fitinhas coloridas ao vento com as melhores mensagens que alguém pode desejar a alguém. Minha pessoa favorita, eu poderia dizer. Te quero junto e perto, contrariando nossos desconhecidos limites geográficos e sentimentais. Bem me quer, mal me quer, me aceite. E responda a minha carta antes de eu bater com os pés na sua calçada outra vez prometendo felicidade: o ano começa daqui a pouco, estamos na contagem regressiva. Não quero perder nada. É o meu pedido.
De qualquer jeito, forma e tamanho,
Você.
Assinado, eu.
Lucas Simões
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