Aí…
De repente você se dá conta de que é saudável se apaixonar e mais saudável ainda desistir de sofrer, quando sofre sabe-se lá pelo quê, simplesmente porque se acostumou com isso. E temendo outro efeito de-vasta-dor, se recolhe, esconde o amor dentro de uma caixa, encolhe a sensibilidade, resseca o fluxo das entregas espontâneas e deixa de fluir, de se misturar, de se completar. Não se permite sair do lugar, porque já aprendeu – dentre tantas coisas inúteis e desnecessárias que aprendemos todos os dias – adormecer a dor e anestesiar o sofrimento. Sabe, a verdade é que a gente se acostuma com a dor, quando ela é reincidente, entende? Quando ela vem, vai, vem, vai e você fica. Fica engolindo desacertos, mastigando ausências compulsivamente, achando que é destino aquele desatino todo. Ela vem, vai, vem, vai e você fica. Fica feito ratazana revirando o lixo emocional, analisando cada farelo, cada migalha; roendo até os ossos dessa dor dilacerante, para compreendê-la na sua totalidade e tentar descobrir onde foi que errou, sem lembrar que, algumas vezes, as coisas não se reduzem a uma explicação qualquer, muito menos aos erros e acertos. Algumas vezes as coisas simplesmente não são. E não é só por que não se encaixam no outro; não se encaixam em você, mas, por divergência ou desistência mesmo. Não são, porque não querem, não podem, não conseguem ser. Não são, porque existir, por si só, dá um trabalho danado, imagine existir com você e com outro? Há os que acreditam que amor é isso: Existir pelo outro. Eu, particularmente, acho que não é bem assim, não. Existir é abstrato demais, para alguém conseguir abraçar dois sem se sentir pela metade, entende? É preciso mais tempo para aprender a ser grande e espaçoso o suficiente para não precisar reivindicar mais espaço. Mas tem gente que acredita. E acreditando que existe pelo outro, quer que o outro faça o mesmo. Exige demais, precisa demais, mas nem sempre o outro, que também tem as suas limitações, consegue lhe oferecer o que quer, precisa e pede.
Uma coisa é fato: Amor não se encaixa em exigências. E pela grandeza que carrega nos seus múltiplos conceitos, inevitavelmente, nós esbarramos em alguns limites quando decidimos sentir e explorar as suas possibilidades, ainda que a sua autonomia não nos permita limitá-lo. O amor pode muito e nós podemos pouco, entendeu a diferença? Às vezes somos rasos demais para dar conta da sua profundidade e é exatamente aí que a coisa afunda. Por outro lado, de que adianta tentar explicar aquilo que mora na casa dos sentimentos? Amor também faz parte desse amontoado de coisas que compõem a vida, mas não cabem em explicações. O amor a gente sente e é só isso.
E quando o encontramos é assim:
De repente! De uma hora para outra, quando você se dá conta de que não é mais um, porque se vê inteiro no outro, mesmo não sendo pelo outro. Quando você decide, com toda segurança do mundo, percorrer caminhos desconhecidos, sem desejar voltar para refazer a rota. Quando você ouve aquele barulhinho bom de coração fazendo festa. E sente as pernas bambas, de quem chega ao final da festa, exausto de tanto dançar ao som desse barulhinho bom, exibindo na boca um sorriso gigante, de quem não deseja sair do lugar, para não perder cada segundo de felicidade. E aí, também de repente, você se dá conta de que inverteu as coisas: Desistiu de sofrer, porque guardou a dor na caixa e libertou o amor!
Danilo Mendonça Martinho, o Poeta da Colina